Uma pesquisa publicada neste ano,
na Harvard Business Review, pelos professores Nufer Yasin Ates, Murat Tarakci, Jeanine
P. Porck, Daan van Knippenberg e Patrick Groenen relatam como a visão da
liderança estratégica é amplamente vista como chave para as mudanças organizacionais.
Isso ocorre porque a visão do C-level não define apenas a direção estratégica -
ela conta uma história sobre porque vale a pena perseguir a transformação e
inspira as pessoas a adotá-la. Não é de surpreender que a teoria e a prática
tenham uma visão muito positiva da capacidade de elaborar e comunicar uma visão
transformadora como uma competência crítica da liderança.
Porém, a pesquisa descobriu que o
impacto positivo de uma visão estratégica de vanguarda se desintegra, quando os
gerentes de nível médio não estão alinhados com a percepção da alta gerência.
Isso pode fazer com que os esforços de mudança estratégica desacelerem ou até mesmo
falhem.
Quando pensamos em líderes inspiradores
e visionários, a primeira resposta que vem em mente é pensar nos CEOs. Líderes
amplamente celebrados como Steve Jobs, Walt Disney e Jeff Welch vêm à mente.
Mas o alinhamento em relação à visão estratégica não é apenas importante para
os gerentes seniores; também é importante para os gerentes de nível médio, coordenadores
e supervisores, que desempenham um papel fundamental na realização de mudanças
estratégicas e reconhecer isto é o primeiro passo para conquistar a confiança destes
níveis de liderança.
A capacidade que os ocupantes da
média gerência têm de inspirar suas próprias equipes e criar alinhamento
estratégico, através da compreensão e compromisso compartilhados com a visão de
futuro da empresa, é um elemento essencial para a execução bem-sucedida das
diretrizes estratégicas. Sem isto, todo o processo poderá ficar comprometido e
própria sustentabilidade do negócio pode correr risco.
É por isso que as estruturas de gestão
das empresas geralmente listam a liderança inspiradora e agregadora como uma
competência-chave de liderança para os gerentes que pretendem avançar em suas
carreiras. Por exemplo, o Project Oxygen, baseado em dados do Google,
identificou a capacidade de obter alinhamento à visão como uma das oito
características dos gerentes de alto potencial.
No entanto, essa ênfase na
construção de líderes visionários e inspiradores para o nível de diretoria se
baseia em uma suposição insustentável: que os gerentes fora do C- Level estejam
sempre alinhados com a estratégia da empresa. E nem sempre isto é uma
realidade.
A pesquisa estudou os aspectos da
gestão estratégica e o alinhamento das equipes à visão e as transformações que ela
implica em duas organizações de serviços na Europa Ocidental (uma no setor de
energia e outra no setor de transporte). Ambas as empresas estavam passando por
processos semelhantes de mudança estratégica e cultural, e criar alinhamento
estratégico em toda a organização era uma meta de alta prioridade em ambas as
empresas.
Foram pesquisados 136 gerentes e
suas equipes para avaliar a influência da visão que o C-Level tinha e o
alinhamento estratégico nas equipes operacionais. Também foram entrevistados
vários gerentes e para entender melhor os relacionamentos encontrados na coleta
de dados da pesquisa.
As descobertas apontaram a
conclusão de que a visão do C-Level é uma faca de dois gumes. Quando os
gerentes de nível intermediário estavam alinhados com a visão estratégica da
alta gerência, as coisas aconteciam como a visão formal da empresa sugeria:
quanto mais esses gerentes se engajassem na visão, quanto maior o entendimento
compartilhado da estratégia e sua disseminação junto a equipe, mais
comprometidos seus times estavam com a execução da estratégia e a obtenção dos
resultados.
Entretanto, para os gerentes
desalinhados com a estratégia da empresa, porém, o lado sombrio da disseminação
de uma visão divergente tornou-se evidente. Quanto mais esses gerentes
desalinhados, mostravam sua própria visão, desalinhada com os propósitos da estratégia,
menos alinhamento e comprometimento estratégico eram observados entre suas
equipes e maiores eram as dificuldades explícitas e implícitas do processo de
transformação.
As conclusões das entrevistas
ampliaram esses resultados. Funcionários de gerentes visionários desalinhados
indicaram que seus gestores criaram confusão e incerteza sobre o que a
estratégia da empresa significava e implicava. Isso desalinhou suas equipes da
estratégia da empresa. Como um funcionário de uma equipe com um gerente visionário
desalinhado explicou: “Bem, conversamos muito sobre estratégia com nosso
gerente. Mas não vejo uma diretriz clara da empresa. Prefiro me concentrar em
minhas tarefas diárias.”
Enquanto a visão era, portanto,
uma força positiva quando os gerentes estavam alinhados com a estratégia da
empresa, ela se tornou uma força negativa na trajetória do alinhamento
estratégico quando a visão do gerente intermediário divergiu daquela
disseminada pela empresa.
A importância dessas descobertas
reside no fato de advertirem contra o que é prática comum em muitas empresas.
Muitas empresas investem pesadamente no desenvolvimento de líderes C-Level. E é
uma unanimidade que, a liderança que inspire a adesão a uma visão transformadora
é vista como uma competência crucial de líderes de nível estratégico.
Ao mesmo tempo, as empresas
tendem a investir significativamente menos na criação de alinhamento
estratégico entre seus gerentes, coordenadores e supervisores. Em vez disso, os
gerentes são encarregados de alinhar a organização em torno da estratégia como
se seu próprio alinhamento fosse dado em virtude de sua posição. Pesquisas
sobre a execução da estratégia documentaram, no entanto, que existem várias
razões pelas quais os gerentes podem não estar alinhados com a estratégia da
empresa (por exemplo, eles estão muito focados nos interesses de sua própria
unidade de negócios e não conseguem ver o quadro geral). O alinhamento
estratégico dos gerentes intermediários não pode ser assumido como um fato
certo e consequente da visão do C-Level, é preciso que este alinhamento seja
trabalhado de forma planejada, metódica e executado com excelência.
Como você garante que os gerentes
estejam alinhados com a estratégia da a empresa? A experiência em trabalhar com
empresas em torno da estratégia, sugere que ele comece com a criação de
alinhamento estratégico entre os gerentes de nível médio antes do início dos
esforços de execução da estratégia. Quando alguém chega a este tipo de posição,
ele já desenvolveu uma capacidade de análise crítica que o torna um aliado
valioso quando convencido de que está engajado naquilo que é a melhor opção
estratégica. Isso não deve ser uma comunicação única, mas um diálogo aberto, de
alto nível, com interlocutores qualificados; as pessoas só se apropriarão de
mudanças estratégicas se forem constantemente convencidas de seu valor para o
futuro da organização. A pesquisa sugere que esses esforços sejam bem
recomendados para garantir que as empresas se beneficiem do desenvolvimento de
uma liderança inspiradora, visionária e engajadora de todos os níveis de gestão
da organização. O alinhamento de todos não pode ser uma opção, é o caminho
inquestionável para todas as empresas que querem fazer de sua transformação
estratégica uma história de sucesso que inspirará outras mudanças no futuro.
Bibliografia:
ATES et al. Why Visionary Leadership Fails. Harvard Business Review, 2019.